quarta-feira, 21 de maio de 2008


Eu aqui, quieta num canto qualquer, deglutindo o meu cotidiano com grande dificuldade. Olhando o meu barquinho pequeno e frágil, razão pela qual eu nunca navego muito além da costa.

Não, não é o meu barquinho que é frágil. Sou eu que sou covarde mesmo.

Não é o tempo nublado. É o pudor.
Não é o mar agitado. É medo.
Não são as rochas. É o maldito conformismo.
Não é o barco. Sou eu.


terça-feira, 6 de maio de 2008

Mensagem numa Garrafa ao Pé d'um Farol.


Precipitava sobre a balaustrada do meu pequeno barco todas as vezes em que meus olhos captavam o menor sinal de luz. Inquieta, já no passadiço, com as mãos trêmulas sobre o timão, passava ao largo sem saber se era seguro me aproximar. Não sou capaz de contar nos dedos quantas vezes eu vivi a mesma cena, como que num dèja vu persistente, sem o mínimo traço de coragem necessário para ir verificar que ponto de luz era aquele que piscava a dezenas de milhas náuticas. Ainda assim, elas exerciam uma atração sem igual sobre mim.

Houve muitos destes pontos de luz nos últimos meses. Das mais variadas formas. Mas todos eles tinham algo em comum: não eram faróis, nem mesmo faroletes. Eram sinais falsos, referências incorretas, armadilhas reluzentes. Quantas vezes torturei o casco, avancei sobre o mar agitado, busquei um porto e nada encontrei. Quantas vezes jurei que ia ser a última vez...

Mas quando o vi brilhar, tive a impressão de que já o conhecia. A luz que vinha do alto da torre me inspirava uma certa familiaridade, calor, segurança. A verdade é que eu sempre tive uma rota, mas preferia o prazer de rumar para o desconhecido. O horizonte escuro das noites em que naveguei incansavelmente, no entanto, preferiu coroar-me com estrelas mortas, com espaços vazios, com os perigos ocultos nesse imenso mar chamado existência.

Sempre tive um Farol esperando. Brilhando, entre o mar e o céu.

Sempre estive buscando outros, teimosa. E nenhum me serviu. Agora temo que com a longa espera, o passar dos anos tenha esgotado sua capacidade de permanecer brilhando para mim. Perguntei-me angustiada se ficaria à deriva para sempre. Ele me prometeu sorrindo que não me deixaria.

Às vezes penso em atracar por uns tempos. Ancorar perto dele, subir os degraus, voar em espiral e chegar até o céu. Ver o subir e o baixar das marés em sua companhia. Ver o Sol de cada dia ser engolido pelo mesmo horizonte que tantas vezes ergueu-se raivoso diante de mim em majestosas tempestades. Vê-lo finalmente adormecido, dividindo o mar e o céu.

Preciso ancorar mais. Sentir mais o gosto da terra. Estar mais perto da gente da terra. Durante muito tempo eu estive feito nômade içando as velas e indo embora, buscando sabe-se lá o quê. Fugindo sabe-se lá do quê.

Porque ele me prometeu sorrindo que não me deixaria.